Entrevista | Paola Giometti fala sobre vida, trabalho e seu novo livro
09/08/2017[widget id=”yuzo_widget-4″]
Paola Giometti é uma daquelas pessoas fáceis de conversar. Você nem precisa iniciar o assunto, é só chegar perto dela e com um sorriso nos olhos ela já te diz: “oi, como vai!”. E daí é um pulo para entrar em seu mundo. A escritora bateu um papo com o Aumanack para o lançamento de seu mais novo livro, O Chamado dos Bisões, que acontece neste sábado (12 de agosto) às 14 horas, na Biblioteca Pública Viriato Corrêa. E também nos brindou um pouco mais sobre mercado editorial, seu trabalho, vida e etc. Confira!
1. Quem é Paola Giometti? Não a profissional bióloga e escritora. Mas quem é essa pessoa e de onde ela tira tanta inspiração para seus livros?
Eu sou uma pessoa apaixonada pela natureza, afinal eu cresci no meio da Mata Atlântica, em uma área de manancial, onde tive a oportunidade de criar sapos, lagartos, taturanas e muitos cachorros. Voltava da escola e fazia trilhas, criava nomes a elas e inventava de voltar para casa só quando encontrasse algo significante. No fim acabei colecionando ossos, penas, sementes, peles de cobra e um monte de outras coisas. É na natureza onde tiro toda a inspiração para escrever ou criar alguma coisa. Para mim, a natureza é a base de qualquer coisa, afinal, todas as grandes ideias no início das civilizações, saíram inspiradas nela.
2. Quando você percebeu que gostaria de escrever livros?
Quando eu tinha 6 anos já perguntava para minha mãe quando eu ia aprender a escrever. Ela dizia que era quando eu aprendesse a ler. Desde sempre criei histórias, e quando ainda não sabia escrever, eu as desenhava em quadrinhos. Geralmente eram histórias sobre animais. Eu dizia que queria ser escritora e que queria poder levar minhas histórias para as pessoas.
3. Por que escrever fábulas?
Sempre acreditei que os animais têm muito a nos ensinar. Lemos fábulas quando somos crianças, e quando crescemos, para onde elas vão? São raros os títulos publicados nos dias de hoje, e ainda por cima voltados aos jovens e adultos. Acabei propondo escrever um tipo de fábula que trabalha com temas mais adultos como medo de abandonar o ninho, responsabilidade na domesticação, importância de estar sempre migrando e o vínculo familiar.
4. Como você realiza suas pesquisas sobre os temas que escreve? Você sente dificuldades de encontrar pessoas que possam instruí-la a respeito do que procura?
Eu costumo procurar referências em sites ou artigos de valor científico, às vezes em livros. Mas nem sempre encontramos o que procuramos. Consegui uma certa consultoria com o meu amigo falcoeiro Diego Bitener, pois quando fui escrever o livro O Código das Águias surgiram algumas dúvidas a respeito do comportamento das aves de rapina que só quem convive, saberia responder.
5. Além do trabalho de escritora, você também gosta de séries e filmes. Fale um pouco sobre os seus cosplays e sobre a cultura atual. Você acha que ela ainda enriquece a fazer as pessoas sonharem? Ou virou um grande mercado visando apenas o dinheiro?
Por mais que a indústria da cultura nerd esteja faturando muita grana com essa moda, ela é muito positiva. Incentiva as pessoas na busca por acompanhar as novidades literárias, além de enriquecer o vocabulário, o conhecimento sobre a diversidade cultural, acrescenta no reconhecimento de tribos que se identificam e interagem… Ser cosplay antigamente era uma forma de mostrar o personagem que você muito gosta. Hoje eu vejo como três possibilidades: o cosplayer ama o personagem e quer interpretar; o cosplayer interpreta o personagem que lhe pedirem e ganha dinheiro com isso; o cosplayer precisa se identificar com uma tribo, então se veste do personagem para integrar com um grupo e depois colecionar fotos desse encontro. Meus cosplays são mais um a forma de exaltar o personagem que gosto e ao mesmo tempo ter a chance de interpretá-lo. Minha primeira representação foi de Jill Valentine quando eu tinha 16 anos. Depois fiz a Mamba Negra do Kill Bill, onde eu percebi que precisava fazer isso mais vezes.
Houve uma época em que eu estava com síndrome do pânico e não tinha motivação para sair de casa. Foi quando surgiu a oportunidade de ser a Lara Croft no Fest Comix e no XMA. Depois desse dia, não parei mais de sair de casa, como Lara, Demolidora, Supergirl ou Paola… Adoro a Supergirl e o Demolidor, mas a Lara Croft tem um estilo que gosto muito, creio que por ser uma caçadora de relíquias e muitas vezes eu me sentia uma caçadora quando fazia minhas trilhas na mata. Interpretar um cosplay é algo muito divertido e terapêutico, na minha opinião.
6. Lobos, Águias e agora os bisões. Mas por que índios? Por que não apenas um bisavô imigrante francês ou inglês que chegou em terras distantes e criou raízes nessas terras?
Imagina você ler uma história contada por um imigrante europeu. A bem da verdade ouvimos histórias assim todos os dias, inspiradas por influências europeias. Então, imagine a história sendo contada por quem descende de antigas tribos. Se esse contador de histórias for um personagem que valoriza a sua cultura antiga e é um observador nato, a narrativa por ele ditada será completamente diferente da ditada dos lábios de um imigrante europeu. Escrever no Fábulas da Terra sobre as origens tribais, por volta de 15 a 20 mil anos, é falar de uma época onde ainda nem índios ou europeus existiam. Portanto, ter o bisavô como um personagem que valoriza a cultura indígena e primal é essencial para que nos convença de um ponto de vista mais sutil, onde só existe a natureza e a sua imensa importância, os seus valores filosóficos e biológicos. Geralmente as fábulas infantis trazem morais sobre o trabalho e a interação social. Acredito que as fábulas adultas e primais podem levar os leitores a refletirem sobre questões mais complexas como a importância de sermos solícitos, o valor de abandonar a própria liberdade em prol de algo maior, sacrifícios que podem nos fazer renascer. Assim, essa visão filosófica da natureza selvagem só seria possível existir aos olhos do contador que realmente reverencia a vida. O que torna Biso especial é o fato de não ser um simples europeu imigrante ou capitalista. Ele é um descendente indígena, que valoriza sua ancestralidade primal, o tipo de mestre que todos nós gostaríamos de ter quando adentássemos numa floresta.
7. Sabemos que muitos autores nacionais acabam ganhando além de fãs, muitos amigos e que são inspirados por eles a escreverem. Como é a relação do público com você e com seus livros?
Lidar diretamente com leitores creio que é a melhor forma de mantê-los por perto principalmente quando se está começando a carreira de escritor. Meus leitores são nerds que me conheceram em eventos onde fazia cosplay, são pessoas que conheci nas livrarias, na bienal, escolas e nas redes sociais. Interagir pelo Facebook e instagram foram os melhores meios de contar a minha jornada e ter um bom engajamento. Creio que quando temos alguém conhecido no caminho em que gostaríamos de trilhar, isso nos motiva a sonhar junto com eles. Muitos começaram a escrever em coletâneas que organizei para a Andross Editora.
8. Você acha que o mercado editorial nacional ainda dá mais valor para o estrangeiro?
Não só o mercado editorial, mas o brasileiro valoriza mais o que vem de fora, pois criou-se no passado uma cultura de que o que é brasileiro, é ruim. Filmes, literatura… Mas isso está mudando visivelmente. Hoje o cinema brasileiro ganha espaço lá fora e a credibilidade do nosso povo. Espero que com a literatura brasileira aconteça o mesmo em breve. Sei que há muitos clichês sendo publicados ou recontagem de histórias que estão na mídia. Mas há autores nacionais vivos muito bons e que estão se destacando.
9. Na sua opinião, qual a diferença dos livros nacionais através da história? Desde livros como os de Machado de Assis, os da Série Vagalume, de André Vianco e outros mais atuais?
Creio que todas as histórias já foram contadas de uma maneira ou de outra. A diferença é que a linguagem, a abordagem muda de acordo com as épocas e suas influências. Eu nunca fui fã de livros da era do romantismo e nem mesmo do realismo. Acho prolixas e clichês. Mas livros como os da série Vaga-Lume eu amava ler. Adoro ler livros juvenis e infanto-juvenis de autores brasileiros. Geralmente são histórias mais dinâmicas onde há uma investigação, uma aventura, um mistério a ser revelado. Acredito que a mesmice dos tempos e a nossa rotina nos fez procurar ainda mais por livros assim. O sobrenatural tem estado cada vez mais dentro das histórias, e é tão atraente que penso esse ser um elemento chave para o sucesso de muitas obras de hoje e das que estão por vir.
10. Livros do século passado são de leitura obrigatória para o vestibular. Você não acha que chegou a hora da própria educação que tanto fala em ler e incentivar o escritor nacional, também indicar nas escolas os livros dos autores atuais?
Penso que é muito importante conhecermos as escolas literárias portuguesas e brasileiras que influenciaram nossos dias no passado. Mas para mim esses livros são como análises históricas. Não foi com eles certamente que aprendi a gostar de ler. Gostei de ler com livros como o de Mário Lago (O Monstrinho Medonhento), e vários da série Vaga-Lume. Eram as aulas na sala de leitura que me incentivaram a isso. Se eu fosse determinar como a leitura deveria ser tratada nas salas de aula, levaria todas as semanas os alunos para as salas de leitura onde faríamos atividades que estimulem a criatividade, contação de histórias e a criação de personagens.
11. Voltando aos seus livros de Fábulas, sabemos que eles fazem crossovers. Como eles se encaixam? Como você vê todo esse universo que criou?
Existe uma ordem cronológica para as coisas acontecerem nos três livros e que não é necessariamente a ordem de publicação. Por exemplo, no livro O Destino do Lobo há o surgimento de um lobo de pedra que só é revelado o motivo no livro O Código das Águias. O Chamado dos Bisões traz crossover com os dois livros, e eu espero que essa brincadeira possa agradar os leitores. Gosto muito de fazer essas ligações que enriquecem a história, criando um emaranhado que faz sentido, pois tudo e todos estão ligados, não são histórias separadas. Isso funciona muito bem uma vez que na natureza tudo funciona de modo orquestrado, um ser depende do outro para existir direta ou indiretamente. Adoro a ideia de gerar no leitor a sensação de que o lobo do primeiro livro é velho, enquanto que no último livro esse mesmo lobo que aparece ele ainda é novo, e assim o leitor pode construir a cronologia em sua cabeça, entendendo que a história dos bisões seria a primeira história a ser contada na série, mas o último livro escrito.
12. Fale sobre o Chamado dos Bisões. Do que trata a história? O que o seu leitor deve esperar? É necessário ter lido os dois anteriores? E se sim, as sequências de lançamento são obrigatórias para entender um ou outro livro?
O Chamado dos Bisões conta a história de uma jovem bisão fêmea chamada Mika, que se perde de sua manada durante a sua primeira migração. Ela percorre as pradarias em busca de sua família até que conhece Yurok, um velho bisão que passa a acompanhá-la em sua jornada, a ensinando sobre um estranho sinal que vem das montanhas. Acredito que qualquer pessoa que leia O Chamado dos Bisões poderá aprender no mínimo bastante coisa sobre esses animais que muito admiro, e ao mesmo tempo poderá em algum momento se ver na pele desses animais. Para ler esse livro, não é necessário ter lido os dois primeiros da série, portanto, a ordem com que ao Fábulas da Terra é lido, não é importante. Creio que a experiência será particularmente diferente quando alguém decide começar a leitura dos livros da maneira que bem entender. A sequência de publicação é: O Destino do Lobo, O Código das Águias e O Chamado dos Bisões. Sendo assim, existem 6 formas diferentes de começar a ler a série. Gosto de dar essa liberdade aos leitores.
O livro será lançado no dia 12 de agosto, sábado, na Biblioteca Pública Viriato Corrêa, Rua Sena Madureira, 298 – Vila Mariana, São Paulo, a partir das 14 horas!
13. O que você espera de si para o futuro? Como escritora, como pessoa e profissional?
Eu espero poder sempre trazer aos leitores algum tipo de conhecimento através da leitura das minhas obras, independente de qual seja, alguma reflexão é no mínimo algo que gosto de pensar proporcionar. Com O Chamado dos Bisões eu encerro a série Fábulas da Terra, pelo menos por algum tempo já que tenho a pretensão de publicar outras obras que eu já havia trabalhado. Escrevo também livros de ficção e realismo fantástico, e gostaria de publicá-los em breve. Por enquanto, o Fábulas da Terra existirá no formato de fanzines. Penso em desenvolver um livro de contos do Fábulas da Terra, onde exploraria histórias de personagens secundários.
14. Deixe um recado para seus leitores!
A leitura é um grande portal que nos seduz, que nos chama, e muitas vezes a ele nos entregamos. Essa entrega nos permite viver vários papéis, e acredito que é uma forma de estarmos em inúmeras vidas ao mesmo tempo e aprendermos com elas.
15. E como entrar em contato com você.
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